Investimentos

Impasse de Angra 3: Terceira usina nuclear brasileira segue inacabada

Angra dos Reis (RJ) — A Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto, onde estão as duas únicas usinas nucleares brasileiras, Angra 1 e 2, é um monumento à engenharia, mas também, um retrato da dificuldade de planejamento de longo prazo do Brasil. O domínio dessa tecnologia, perseguida desde o governo de Juscelino Kubitschek, quando o primeiro reator de pesquisas foi inaugurado, representa o ingresso do Brasil em um seleto grupo de nações.

O projeto de Angra começou a ser construído em 1973, ainda durante o governo militar, que tinha, implicitamente, o interesse de desenvolver a capacidade para a fabricação de armas. Com a redemocratização e a Constituição de 1988 proibindo expressamente a construção da bomba, afastar a má fama do uso bélico do urânio é um esforço constante do setor.

Angra 1 foi encomendada à empresa norte-americana Westinghouse e inaugurada comercialmente em 1985. Mesmo antes de pronta, com a ampliação das restrições americanas à proliferação nuclear, uma nova parceria, com a Alemanha, foi feita para a segunda usina, Angra 2. O projeto é da empresa Siemens (hoje comprada pela Framatome, subsidiária da estatal de eletricidade francesa EDF). Angra 2 foi concluída em 2001.

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“Mausoléu”

A terceira usina de Angra segue inacabada. Está com 65% da construção pronta, e 85% das partes e equipamentos já foram comprados e estocados. Com a promessa de gerar 1,4 gigawatts, o projeto teve o início das obras civis em 2010. Mas os trabalhos foram paralisados em 2015 e permanecem sem definição.

A interrupção aconteceu no meio da operação Lava Jato que investigava suspeitas de desvios na construção da unidade. Calcula-se que serão necessários entre R$ 23 e 27 bilhões para concluir Angra 3.

No local é possível observar que o prédio do gerador está quase pronto. Mas a estrutura onde ficará o reator, em formato esférico, está na metade. No canteiro, pilares de concreto não sustentam nada e milhares de vergalhões ficam expostos saindo das estruturas. O governo federal vem dando mostras de que quer mudar isso e evitar que Angra 3 se transforme em um grande elefante branco.

O ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira, pretende retomar a construção. Ele compara as obras a um “mausoléu”. “Nenhum de nós, em sã consciência, vai carregar, nem ficar com aquele mausoléu (Angra 3), para servir de visitação ao mundo do fracasso da gestão do governo brasileiro”, disse o ministro em audiência na Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados no último dia 13.

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Retomada

A decisão aguarda o estudo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) que deve definir o investimento necessário na obra. A expectativa é que o documento seja encaminhado nos próximos dias.

Para Silveira, não é possível recuar sobre a construção da unidade nuclear depois de todo o investimento feito. O assunto deve ser levado, até o final de setembro, ao Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), que terá a palavra final.

“Não tem que se discutir o custo-benefício. Vou levar ao CNPE a continuidade das obras de Angra 3”. Mesmo sem um levantamento do que já foi gasto nas obras, os R$ 20 bilhões estimados pelo ministro são considerados modestos por especialistas.

Deve pesar na decisão o aporte necessário para descontinuar as obras. Fontes do setor calculam que o valor ficaria entre R$ 12 e 17 bilhões, de subsídios e isenções recebidos pelo tipo de projeto, mas que deverão ser pagos em caso de cancelamento.

Custo da indecisão

No canteiro de Angra 3, parece que todos foram almoçar e não voltaram mais. Diversas estruturas estão instaladas, mas sofrem com o tempo e as intempéries. Um exemplo são os gigantescos transformadores, parados há uma década.

Alguns desses equipamentos foram comprados há décadas e só resistem ao tempo e à maresia graças ao trabalho das equipes de conservação. A paralisia tem um custo alto. Inativa, Angra 3 custa R$ 250 milhões aos cofres públicos por ano.

Além do canteiro, há 34 galpões provisórios no complexo, onde estão guardadas milhares de partes e equipamentos comprados para montar a usina. Como um gigantesco quebra cabeças, tudo é verificado, catalogado, lubrificado. Tem a umidade controlada e permanece guardado, em um esforço para que, quando necessário, tudo esteja como novo.

Um grupo de trabalhadores passa os dias aplicando jatos de cimento nos vergalhões expostos da obra para garantir que, mesmo à beira mar, os materiais mantenham a resistência para a conclusão do projeto.

Esses armazéns ocupam a maior área do complexo com mais de 50 mil m². Em outras duas localidades, mais cinco depósitos armazenam outras partes de Angra 3. O coração da usina, o vaso do reator, fabricado e estocado há 40 anos, continua na Nuclep, em Itaguaí (RJ), a 120 km da obra.

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