A agência de classificação de risco Moody’s elevou a nota de crédito do Brasil de Ba2 para Ba1, o que deixa o país a apenas um degrau de retomar o grau de investimento, espécie de selo de bom pagador que é referência para investidores. A agência, que também manteve a perspectiva positiva para o país, justificou a melhora citando crescimento robusto e histórico de reformas, mas pondera que a credibilidade do arcabouço fiscal ainda é “moderada”, o que tem impacto no custo da dívida.
“Essa elevação reflete melhorias substanciais no crédito, que esperamos que continuem, incluindo um desempenho de crescimento mais robusto do que o avaliado anteriormente e um histórico crescente de reformas econômicas e fiscais que conferem resiliência ao perfil de crédito, embora a credibilidade do arcabouço fiscal do Brasil ainda seja moderada, como refletido no custo relativamente alto da dívida”, diz trecho do relatório.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, comemorou e aproveitou para defender a agenda da equipe econômica de reequilíbrio das contas públicas.
— Estamos a meio degrau de grau de investimento, porque estamos a um degrau com viés positivo — afirmou. — Não está dado. Temos um trabalho a fazer, mas é uma possibilidade concreta. O que parecia muito distante, parece que está à mão, se não tivermos receio de tomar medidas necessárias para o reequilíbrio das contas.
Segundo o ministro, é importante perseverar no equilíbrio entre a política fiscal e a monetária, o que vai possibilitar a estabilização da relação dívida/PIB. Haddad afirmou que o desequilíbrio foi o que levou à perda do grau de investimento em 2015.
— Se não baixarmos a guarda em relação às despesas e às receitas, acredito que podemos completar o mandato do presidente Lula retomando o grau de investimento — disse o ministro.
Na semana passada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Haddad se reuniram, em Nova York, com representantes de Moody’s, S&P e Fitch, de olho na possibilidade de recuperação da nota do país. As agências avaliam a capacidade de uma instituição ou país pagar suas dívidas.
O Brasil alcançou pela primeira vez o grau de investimento em 2008, no segundo governo Lula, mas perdeu o selo em 2015, no contexto da crise econômica deflagrada pelas pedaladas no governo de Dilma Rousseff.
Segundo a Moody’s, a dívida brasileira deve se estabilizar no médio prazo, mas em nível relativamente alto. A agência de risco revisou o crescimento do PIB para 2,5% neste ano, uma projeção mais conservadora do que a média do mercado, de 3%.
Alerta para o fiscal
A agência afirma que a rigidez estrutural nos gastos e o aumento das despesas obrigatórias são fatores limitantes para a eficácia da política econômica: “essas limitações pesam na credibilidade da política fiscal e complicam os esforços contínuos para cumprir as metas fiscais, o que prejudica a eficácia da política e contribui para prêmios de risco relativamente altos”.
Para Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central e professor da Georgetown University, a Moody’s “comprou a tese” de que o crescimento é mais permanente, fruto de uma série de mudanças feitas ao longo de vários governos. E sublinha que o relatório da agência provoca Haddad para o avanço em medidas fiscais:
— Além do outlook positivo, a agência “joga uma cenoura” para Haddad ao dizer que, se o Brasil fizer algo sobre a rigidez dos gastos no Orçamento e adotar medidas fiscais para conter a alta de gastos obrigatórios, poderia levar o Investment Grade — destacou. — Em paralelo, diz que se o PIB cair, seria negativo, com impacto adverso para a nota.
O grau de investimento, porém, dificilmente viria ainda neste governo, avalia o especialista. É que, ainda que o Brasil esteja “na boca do gol”, a questão fiscal não é um problema fácil de resolver, argumenta. Volpon lembra que o avanço da economia pode ser efeito de um gasto fiscal em excesso desde a PEC da Transição.
— Governos costumam fazer reformas no início, com tempo para absorver. E tentam gastar mais quando está mais próximo das eleições. Este, porém, gastou muito no começo — afirmou.
Tatiana Pinheiro, economista-chefe da Galapagos Capital, afirma que as reformas aprovadas no país nos últimos anos criaram mais segurança jurídica para viabilizar investimentos. A perspectiva positiva da nota de crédito, ela diz, sinaliza a análise de perto pela agência do único fator pendente: a condução fiscal. Caso haja indicação de melhora no ponto, há mais chances de a agência revisar para cima o atual nível:
— Se a condução fiscal for feita no sentido de queda da relação dívida/PIB, é grande a probabilidade do caminho para o grau de investimento. A chave para o sucesso é o aumento dessa credibilidade. A lição de casa está no lado dos gastos — ela diz.
O grau de investimento, diz a economista-chefe, é um fator necessário para uma maior entrada no país do fluxo de capital estrangeiro. O atual nível, de grau especulativo, funciona como uma barreira para parte dos investidores.
— Estamos a meio degrau de grau de investimento, porque estamos a um degrau com viés positivo. Não está dado. Temos um trabalho a fazer, mas é uma possibilidade concreta. O que parecia muito distante, parece que está à mão, se não tivermos receio de tomar medidas necessárias para o reequilíbrio das contas – Fernando Haddad, ministro da Fazenda.
Para Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, há dúvida se o equilíbrio do cenário fiscal do país sustentaria nova elevação da nota nos próximos dois anos. Vale projeta que, nos quatro anos do governo Lula, a dívida deve subir cerca de 12 pontos percentuais, passando de 72% para 84% do PIB. Para ele, o cenário é diferente do de 2008.
— Esse cenário fiscal, com déficit recorrente, me coloca um pouco de dificuldade de acreditar que estamos em um caminho fiscal equilibrado e a um passo de chegar ao grau de investimento, como a Moody’s sinaliza — disse o economista, destacando que a notícia é “positiva” e tem como efeito a tomada de crédito mais barata por parte das empresas.
Custo do crédito menor
Luiz Carlos Mendonça de Barros, economista e ex-presidente do BNDES, avalia que o déficit público deve ficar entre 0,5% e 0,6% do PIB este ano. Se o país mantiver crescimento do PIB entre 2% e 3%, ele acredita que é possível reconquistar o selo de bom pagador:
— A elevação da nota de crédito hoje (ontem) é importante porque acaba com as análises pessimistas. Muita gente na Faria lima está passando vergonha.
O ex-presidente do Banco Central (BC), Gustavo Loyola, observa que o desempenho do PIB este ano, que superou as expectativas dos analistas, contribuiu para a elevação da nota, e não descarta a possibilidade de o Brasil alcançar o grau de investimento ainda durante o governo Lula, desde que o cenário fiscal não piore.
— Tenho dúvidas e não acho que seja tão fácil assim, mas é possível — disse Loyola, que considera a avaliação da agência “otimista”. — Eles acreditam que a dívida vai estabilizar, mesmo em um patamar elevado. Não tenho tanta certeza.
O ex-presidente do BC lembra que a melhora da nota é positiva para o país e melhora as condições de financiamento para as empresas brasileiras, com facilitação de acesso ao crédito internacional.
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